Realizadores têm garantido uma difusão significativa das produções, mesmo com a política desestruturada e descontinuada
Por Maykson Douglas
O mesmo cinema alagoano que deu seus passos
iniciais com a ajuda de Guilherme
Rogato, italiano que
veio para o Brasil, também possui em sua história nomes como o do
premiado cineasta Celso Brandão. A cultura audiovisual, mesmo com a ausência de
políticas de incentivos à produção, resistiu ao tempo e tem se destacado no
cenário nacional. Produções realizadas por jovens alagoanos têm cada vez mais
sido selecionadas para mostras e festivais em todo o país. Por outro lado, em
seu berço, quem pretende
viver da sétima arte enfrenta problemas com a falta de políticas de fomento.
Alagoas não tem a cultura cinematográfica de contar sua história,
diferente de outros estados da federação. Pernambuco, por exemplo, em 2014,
conseguiu aprovar a lei
que disciplina a promoção, o fomento e o incentivo ao audiovisual no âmbito do
estadual e criou o Conselho Consultivo. A sanção da lei possibilita que anualmente
seja investido o montante mínimo de R$ 33,5 milhões, para destinação ao Fundo
Pernambucano de Incentivo à Cultura (Funcultura), sendo R$ 11,5 milhões para o
audiovisual, e R$ 22 milhões para as demais linguagens. No caso do estado
vizinho, o Funcultura beneficia toda a cadeia produtiva, democratizando a
participação projetos de diretores consagrados e também de iniciantes.
Por aqui, como não existe uma política específica para o setor, inviabiliza
que sejam desempenhadas ações que beneficiem todo o segmento, incentivando
projetos de realizadores, espaços de pesquisa, formação e difusão, além da
criação de produtos. Como cinema historicamente foi uma arte cara, a
contrapartida governamental faz-se imprescindível, já que a maioria dos
realizadores não têm recursos para a produção independente.
Conforme explica Larissa Lisboa,
analista de audiovisual do Serviço Social do Comércio (Sesc) “os hiatos
[lacunas] entre as edições dos editais de incentivo realizados pela Prefeitura
de Maceió e pelo Governo de Alagoas, resultam em filmes não realizados, e os
recorrentes atrasos nos pagamentos, inferem em prejuízos incomensuráveis aos
que tiveram projetos aprovados e ficaram sem poder cumprir o planejamento
previsto. A realização sistemática de editais de incentivo ao audiovisual
alagoano não é uma realidade, o que imprime retrocessos e interrompe a fluidez
do setor” pontua. “A edição do edital do estado de 2015 foi cancelada em 2016,
reformulado e lançado ainda no mesmo ano, o qual só teve o processo de repasse
dos recursos iniciado no final de 2017. E o último edital da Prefeitura de
Maceió foi realizado em 2015” ressaltou a analista.
Para
o Superintendente de Assuntos Culturais da Secretaria de Estado da Cultura,
Paulo Poeta, o cinema e outras artes [teatro e dança] ainda não alcançaram a
profissionalização. “Ninguém consegue viver só dessas atividades
profissionalmente em Alagoas ainda, é muito incipiente e não foram feitas
políticas ao longo do tempo que estimulassem e que tivessem continuidade. Em
tempo, estamos tentando corrigir isso e deixar alguns eventos que são perenes.
Estamos preparando editais com mais recursos e em constante diálogo com o Fundo
Setorial do Audiovisual e, a partir daí é que nós vamos conseguir deslanchar
com o audiovisual” explica.
Jovens realizadores
Dário
Júnior, realizador maceioense, conta que o despertar de sua paixão pelo cinema
veio ainda em 2012, quando estudava comunicação na Universidade Federal de
Alagoas (Ufal). Sua primeira realização, o filme Wonderfull - meu eu em mim,
produzido por meio de edital da prefeitura de Maceió, foi premiado na sétima
edição da Mostra Sururu de Cinema Alagoano. O documentário que conta a história
de uma mulher transexual também foi selecionado em festivais e mostras dos
estados de Pernambuco e Bahia. Em suas participações em mostras ele fala da cena
do audiovisual em outras unidades federativas. “É notória a discrepância entre
Alagoas e outros estados, não dá nem para comparar. Em Alagoas ainda faltam
algumas coisas para melhorar, se ao menos tivéssemos a Lei de Incentivo à
Cultura, mas nem isso temos ainda.”, expôs o realizador.
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Dário Junior na gravação de Wonderful - meu eu em mim. Foto: Itawi Albuquerque. |
Dário
não é o único que teve uma realização exibida fora do estado, entre
janeiro e abril de 2018, filmes alagoanos foram selecionados para a 21ª Mostra
de Cinema de Tiradentes (MG), 3º Cine Paraíso (PB), II Mostra Itinerante Livre
de Cinema: "Milc - Por Outras Fortalezas" (CE), 11º Curta Taquary –
2018 (PE), Festival Mimoso de Cinema (BA), II Festival de Cinema do Paranoá
(DF), 2ª Mostra de Cinema Contemporâneo do Nordeste (BA) e 6º FestCine - Curta
Pinhais (PR).
Também
ex aluna do curso de comunicação da Ufal, Maysa Reis, começou a se interessar
por cinema ainda na graduação. “Fui convidada por um professor para participar de um
projeto de extensão que era um laboratório de curtas metragens. Na época eu
pagava a disciplina de fundamentos do cinema e, foi aí que eu vi, quando eu
mergulhei dentro do universo de pesquisa e de fazer cinema, me apaixonei
naquele momento, depois disso decidi que toda minha formação, toda minha vida
de alguma forma estaria ligada ao cinema. A partir de então, todas as minhas
pesquisas, toda a minha formação foi voltada para o audiovisual”, relembra.
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Maysa Reis, ex-aluna do curso de comunicação social da UFAL. Foto: Itawi Albuquerque. |
A jovem cineasta atualmente
está matriculada no Programa de Pós-Graduação em Cinema da Universidade Federal
de Sergipe. Para Maysa, “a especialização é importante porque em Alagoas não
temos formação nenhuma em audiovisual, então as pessoas que estão fazendo
cinema em Alagoas são autodidatas e são pessoas que estão aprendendo com a
experiência, isso é ótimo. Mas eu acredito na educação como fonte de
desenvolvimento, então eu quero aprender, construir e estudar para chegar no
meu estado e construir pelo viés da educação também. Ensinar pessoas a fazer
cinema, a pensar cinema e fazer disso a minha vida, esse é meu sonho”, pontua.
As produções recentes comprovam que mesmo com a política desestruturada
e descontinuada, a resistência de realizadores, tem garantido uma difusão
significativa das produções. Ultimamente tem se notado com frequência a
inserção de filmes alagoanos em mostras e festivais e, apesar de todo o cenário
desfavorável à produção audiovisual, jovens realizadores têm ido contra a
corrente e fortalecido a produção cinematografia local.